skip to Main Content

Entenda porque você se ilude (e eu também) com tudo na vida, e como sair dessa armadilha em que você mesmo se coloca

Foto: Unsplash

Escrito por Rossana Perassolo

Nós nos iludimos. Nós, e mais ninguém.

Nós temos sonhos, lutamos todos os dias para conquistar esses sonhos e, quando finalmente conseguimos, nos damos conta que a realidade é muito menos encantadora do que gostaríamos.

Por que essas ilusões ocorrem? O que leva nossa mente a fazer com que nós acreditemos tanto em algo que, quando aconteça finalmente, a gente veja que é tão diferente das nossas expectativas?

Quão feliz você seria ao conquistar seus maiores sonhos? Conseguir aquele emprego maravilhoso, mudar para a cidade ou País dos seus sonhos, conquistar a mulher ou o homem da sua vida? Então eu te pergunto, já que você provavelmente já realizou pelo menos algum desses grandes sonhos: quão feliz você É, agora que já realizou esse sonho (ou esses sonhos, no plural)?

Se medirmos essas coisas nos 2 momentos, antes e depois de conseguir, as pontuações serão bem distintas. A psicologia estuda isso há décadas.

Isso acontece muito com o chamado “cérebro apaixonado”, em que muitas vezes colocamos os holofotes no lado positivo, e depois achamos que a máscara caiu. Nem sempre é o que acontece, os sinais já estavam lá, mas o foco estava no positivo.

Vamos falar de um conceito importante conhecido como ilusão de foco (do inglês focusing illusion). Para entender melhor como funciona, nosso cérebro é incrível, mas limitado, quando imaginamos o impacto que qualquer coisa terá na nossa vida, projetamos o futuro focando naquilo que é emocionalmente marcante, e ignoramos o que não tem uma grande carga emocional (e que muitas vezes é super importante para a nossa decisão). São diversos os exemplos, fazemos isso com tudo: nos relacionamentos, no trabalho, quando idealizamos o local onde queremos viver, e por aí vai.

O psicólogo Daniel Kahneman, ganhador de prêmio Nobel de economia em 2002 (veja referências abaixo), fez alguns estudos fascinantes nessa área, que ficaram muito famosos no meio, justamente confrontando expectativa x realidade. Ele foi até o Meio Oeste dos Estados Unidos e perguntou “quão feliz você seria se você se mudasse para a Califórnia?” Depois, perguntou às pessoas que já se mudaram para a Califórnia, vindas do Meio Oeste dos Estados Unidos, “quão feliz você realmente é?“, e descobriu que as pessoas superestimaram absurdamente o impacto que essa carga emocional traz. As pessoas não pensaram no trânsito, na dificuldade em conseguir um novo emprego e em outras dificuldades que encontraram lá.

Isso acontece muito com o “emprego dos sonhos”. O pacote financeiro + benéficos é super atrativo (a bola de ferro), e você decide ir. Na real? Foi um movimento lateral em termos de desafio de carreira, de desenvolvimento, ou até foi um crescimento real, mas está tendo que trabalhar muito mais, passando muito menos tempo com a família e não está acompanhando o crescimento dos filhos como gostaria, e os valores da empresa são incongruentes com os seus valores pessoais. Mas, naquele momento, o foco estava na carga emocional que o pacote financeiro e todos os benefícios trariam de positivo, aparentemente, para a sua vida. Estou contando aqui apenas o exemplo de pessoas que já tem emprego e equilíbrio financeiro e escolhem ganhar mais dinheiro em detrimento de tempo com a família, saúde e realização de verdade. Passado o encanto, percebe que é cada vez mais infeliz, deteriorando cada vez mais as relações, tão vitais para a nossa felicidade (veja mais no artigo Felicidade: um exercício).

O ponto é: tudo, absolutamente tudo na vida, tem PERDAS e GANHOS. Pare de se iludir. Pare de querer cair nesse tipo de ilusão. Duvide das suas vontades. Sempre que algo fizer muito sentido, que desejar muito algo, questione-se. Está tudo bem ser otimista, isso é fantástico! Mas quando for preciso tomar decisões, questione-se, veja os dois lados da moeda com compreensão verdadeira (não é preciso concordar, mas “compreender mais, e julgar menos”, como citou Spinoza no Livro 3 de sua grande obra chamada “Ética”).

O contrário também é verdadeiro, porque quando falamos em emoção isso conta para positivo e negativo. Quando estiver vendo que tudo vai dar errado (a turma dos ansiosos se identifica!), isso provavelmente também não faz sentido algum. Questione-se.

Como quebrar esse ciclo?

É nos detalhes que a vida acontece, uma vida muito mais vibrante e com você no comando. Fazer esse exercício de questionar a si mesmo não vai fazer com que você não se mude para outro País, se for o que você realmente quer, mas vai fazer com que faça isso tendo considerado prós e contras, trabalhado em minimizar as ameaças e potencializando as oportunidades.

Quando tiver confrontado a realidade, essa não vai ser tão diferente da expectativa (ou, pelo menos, a realidade não vai decepcionar a ponto de te derrubar, você vai saber trabalhar com isso), e vai ver que viver uma vida fora da ilusão é uma escolha muito mais sábia.

Em que ilusão você tem se colocado?

 

REFERÊNCIAS E RECOMENDAÇÕES (Pedro Calabrez – Neurovox) – Sobre Daniel Kahneman e diversos estudos acerca da ilusão de foco e seus impactos (caso o indivíduo morasse na Califórnia, tivesse filhos, fosse mais rico, mais bonito ou com melhor qualidade de vida – estudos separados):

  • Kahneman, D. (2013). Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. Rio de Janeiro: Objetiva.
  • Schkade, D. A., & Kahneman, D. (1998). Does living in California make people happy? A focusing illusion in judgments of life satisfaction. Psychological Science, 9(5), 340-346.
  • Powdthavee, N. (2010). And You Think Having Children Will Make You Happy! A Case of Focusing Illusion (No. 08/31).
  • Kahneman, D., Krueger, A. B., Schkade, D., Schwarz, N., & Stone, A. A. (2006). Would you be happier if you were richer? A focusing illusion. science, 312(5782), 1908-1910.
  • Kaczmarek, L. D., Enko, J., Awdziejczyk, M., Hoffmann, N., Bia?obrzeska, N., Mielniczuk, P., & Dombrowski, S. U. (2016). Would you be happier if you looked better? A focusing illusion. Journal of Happiness Studies, 17(1), 357-365.
  • Mendes-da-Silva, W., Onusic, L. M., Norvilitis, J. M., & Moura, G. L. (2013). Focusing illusion in satisfaction with life among college students living in Brazil. Revista de Administração de Empresas, 53(5), 430-441.

Artigo publicado no LinkedIn.

Rossana Perassolo é Mentora e Master Coach formada pela Sociedade Brasileira de Coaching, com especializações em psicologia positiva, carreira, leader, executive, business, mentoring, personal & professional coaching. Certificações internacionais pela Association for Coaching (AC) e pelo Institute of Coaching Research (ICR). Analista comportamental formada em teorias DISC e motivadores pela TTI Success Insights. Analista comportamental formada em DISC, attributes & values pela IMX Innermetrix. Formada em publicidade e propaganda pela UFMT, com MBA em marketing pela ESPM. Por 15 anos atuou em grandes multinacionais da indústria de tecnologia da informação, 12 deles liderando times em todos os continentes, especialista em implementar, desenvolver e manter times de alta performance em diferentes países.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Back To Top